quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Fiesta Movement: você conhece?

Você já ouviu falar nesta ação de marketing da Ford nos Estados Unidos? Pois é, eu não tinha ouvido falar até o começo desta semana, quando li uma entrevista de um dos idealizadores da campanha, Bud Caddell, da Undercurrent, no blog do antropólogo Grant McCracken.


A primeira vista, trata-se de um “tradicional” marketing de guerrilha, ou marketing viral, mas quando procuramos mais detalhes sobre a sua elaboração e a idéia que sustentam esta campanha, logo vemos que aí tem muita coisa inovadora, que parte de um princípio de troca de interesses.


Em que consiste esta campanha: a partir de redes sociais, com foco no Youtube, a Ford e a Undercurrent selecionaram 100 pessoas e deram a elas um carro, o novo Fiesta, por 6 meses (com gasolina paga), com a condição de que a cada mês eles cumprissem algumas missões. Pois bem, a sacada está na seleção destas pessoas, que possuem algo em comum: são pessoas consideradas fenômenos da internet, com multidões de seguidores e que estão sempre em busca da multiplicação destes. Ok, seriam os famosos trend setters, influenciadores... enfim... Contudo, a inovação está na maneira em como este recrutamento foi feito e nas instruções para os vídeos e fotos: a marca não deveria aparecer (ok, ela irá aparecer, mas de uma forma natural, mesmo porque o carro tem que estar em cena) e a intenção não era fazer uma propaganda, mas sim incorporar o carro ao dia-a-dia, das tarefas comuns às mais inusitadas. O outro ponto crucial desta relação foi o modo como ela foi estabelecida: o carro foi fornecido como instrumento de captação de mais seguidores, bem como as tarefas e missões a serem cumpridas, e é nisso que essas pessoas estão interessadas, então aí está a troca. O que é relevante nisso é que quando há um interesse (monetário ou simbólico) recíproco (o que não significa, necessariamente, igualitário) a interação entre estes agentes (como foram nomeados pelo projeto) e a Ford passa a ocorrer de uma maneira peculiar: o carro passa a ser incorporado a algo que estas pessoas já faziam, mostrando-se um elemento complementar às histórias que já eram criadas por eles. Desta maneira, a Ford conseguiu o que queria: mostrar tudo o que o carro poderia ser, de acordo com o interesse de cada um, seja ele qual for.


É importante ainda notar é que este projeto foi iniciado em um período de crise e em um país onde carros pequenos não são o que poderíamos chamar de o maior sucesso. Resultado? Sim. A partir desta iniciativa com custos reduzidos (devido tanto a produção, quanto ao pequeno número de pessoas que estavam envolvidas), nas primeiras seis semanas de lançamento do carro foram vendidas 10 mil unidades.


O que vemos nesta experiência proposta é um grupo de pessoas mostrando de diferentes maneiras a ressignificação de um bem material. Podemos objetar que estas reapropriações foram estimuladas pelas missões propostas, contudo, ainda assim, podemos observar como pessoas de diferentes lugares dos Estados Unidos, com diferentes características, tornam reais, ao seu modo, as missões que foram colocadas. A observação dos vídeos rende uma boa reflexão antropológica acerca das relações estabelecidas entre estes agentes e o carro, entre os agentes e a Ford, entre os agentes e as pessoas que assistem aos vídeos e, por fim, entre a Ford e essas pessoas que assistiram aos vídeos (espero desenvolvê-la muito em breve).


A partir de 100 pessoas houve uma multiplicação das relações sociais estabelecidas entre indivíduos e entre o bem material, o que proporcionou não só a venda dos veículos, mas também a (re)construção da marca e o acesso a possíveis modificações que deverão ser feitas nas próximas versões.


Como McCracken coloca, esta campanha poderia ser um tradicional marketing viral se a Ford solicitasse aos agentes que falassem de sua marca, contudo, o que se incentiva é a criação e construção das percepções por parte do agente, sendo disseminada e compartilhada com a sua rede e, em meio a este processo, há a contribuição para a reconstrução da marca Fiesta.


A partir de um bem material estimula-se a criação de conteúdos criativos que estão imersos nas teias de significados de cada agente. É uma maneira de capturar os gostos disponíveis no campo do consumo para que sejam transformados em bens materiais a partir do universo dos possíveis contidos no campo de produção (para utilizar as categorias de Bourdieu).


Para finalizar, assistam aos vídeos no site da campanha ou no YouTube, são vários. Eu já vi alguns e elegi este daqui como um dos mais bem humorados da missão de criar um vídeo a partir de filmes: http://chapter1.fiestamovement.com/missions/view/655


E este outro na missão de ironizar o Pimp My Ride (programa da MTV que “tuna” carros): http://chapter1.fiestamovement.com/missions/view/651



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Referências utilizadas


Grant McCracken: http://cultureby.com/

Fiesta Movement: http://chapter1.fiestamovement.com

A distinção (Pierre Bourdieu)



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