domingo, 11 de abril de 2010

Cyberpunk: o que é isso?

Olás!

Demorei, mas cá estou novamente! Peço desculpas pelo longo intervalo, mas o trabalho e os estudos têm me consumido, mas determinada a conseguir deixar um tempo para me dedicar ao blog! (quem vive essa rotina sabe como que é, né?). Mas enfim, quem realmente quer consegue, não é mesmo? (como outros tantos blogueiros podem atestar).

Estou preparando um texto sobre o Veblen, que me fez pensar muito sobre coisas que eu havia lido sobre ele (críticas pesadas) e que me levaram a ler o quanto antes a sua clássica obra ("A Teoria da Classe Ociosa).

Para interromper o jejum, segue mais um texto que foi publicado no "Para entender a Internet". É um texto bastante interessante sobre o termo "cyberpunk" e sua origem. Leiam, vale bastante a pena!

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Cyberpunk 
por Fábio Fernandes @fabiofernandes

Em 1986, com o lançamento da coletânea de contos de ficção científica Mirrorshades (até hoje inédita no Brasil), o escritor e editor Bruce Sterling apresentava ao mundo onze novos autores do gênero e, além disso, um prefácio que era uma verdadeira carta de intenções à comunidade de ficção científica. Nesse texto, Sterling prestava uma homenagem aos autores da New Wave britânica dos anos 1960, escritores revolucionários como Michael Moorcock e J.G.Ballard, e anunciava que o marasmo no qual a ficção científica havia mergulhado nos anos 1970 e meados dos 1980 acabava ali mesmo.

Com uma FC que tratava sem pudores das angústias contemporâneas (com direito a sexo, drogas, rock´n´roll e muita atitude punk) e sem deixar de lado o uso maciço da tecnologia, os contos de Mirrorshades foram um divisor de águas na literatura do gênero. O prefácio de Sterling se tornou o manifesto oficial do agora oficialmente batizado Movimento Cyberpunk – os punks cibernéticos. Mas o termo cyberpunk não foi inventado por nenhum dos cinco integrantes oficiais do Movimento (além de Sterling, William Gibson, Rudy Rucker, Lewis Shiner e John Shirley) nem pelos demais autores da coletânea. Ele foi criado seis anos antes, quando o escritor de ficção científica Bruce Bethke sofreu um ataque de hackers. Irritado e preocupado, Bethke escreveu o conto Cyberpunk! Essa história envolvendo hackers adolescentes, foi escrita em 1980. Com esse título, Bethke tinha a intenção de inventar um neologismo que exprimisse a justaposição de atitudes punk e alta tecnologia.

Seu pensamento não era muito diferente do expresso por Bruce Sterling ao escrever seu manifesto. A diferença era que Bethke achava que isso ainda estava por acontecer, e os escritores do Movimento sabiam que, embora eles próprios tivessem nascido e vivido suas infâncias e adolescências antes do advento do computador pessoal (Gibson, por exemplo, nasceu em 1949), já pertenciam a uma geração envolvida com alta tecnologia, e tinham uma razoável fluência técnica.

Some-se ao conto de Bethke um empurrãozinho da parte de Gardner Dozois, na época editor da revista de contos de ficção científica americana Isaac Asimov Magazine, que ajudou a popularizar o termo – e a palavra cyberpunk entrou no imaginário da humanidade para nunca mais sair.

Mas o maior representante cyberpunk não é Bethke nem Sterling. Ele se chama William Gibson, e sua estréia oficial na literatura aconteceu dois anos antes de Mirrorshades, com a publicação de Neuromancer, em 1984. O livro se tornou um clássico em pouco tempo, e não apenas pela criação de outra palavra fundamental para a tecnologia e a cultura, o termo ciberespaço: as 271 páginas de Neuromancer nos apresentam cenários futuristas velhos e sujos, caindo aos pedaços, onde computadores modernos se misturam a tradições orientais e hackers são os mocinhos, lutando contra megacorporações transnacionais corruptas através de ações de terrorismo midiático.

Todo esse panorama, que hoje em dia sabemos ser real só de vivê-lo em nossa experiência cotidiana, foi preconizado por Gibson em seus livros. A extrapolação científica não foi de todo bem-sucedida: pelo menos até o momento, não temos um ciberespaço tão elaborado e elegante quanto o de Neuromancer, nem implantes tão incríveis quanto os de seus personagens. (O próprio William Gibson costuma dizer em entrevistas que, se fosse profeta, teria inventado o celular, pois esse aparelho inexiste no futuro de Neuromancer.) Em compensação, o que Gibson errou na ciência acertou de sobra no comportamento e na moda. Mais do que acertar, Gibson ajudou a criar o comportamento da cultura vigente hoje. A cibercultura, com sua ética hacker, sua música eletrônica, sua sampleagem cultural, suas tribos urbanas; um planeta interconectado, globalizado, interativo, voyeurista, pró-ativo; um mundo onde não engolimos impotentes o que os meios de comunicação vomitam, mas onde nos manifestamos publicamente através da Web e também através de eventos como flash mobs, onde começamos a ver projetos de “arquitetura líquida” (termo criado pelo arquiteto brasileiro Marcos Novak) e, com celulares, smartphones, iPods e outros dispositivos móveis, nos tornamos a passos largos endereços de IP móveis em uma cultura wireless, nas palavras de William Mitchell.

Pensando bem, talvez o futuro de histórias como Neuromancer nem seja tão improvável de acontecer, nem esteja tão distante de nós no tempo. Hoje, mais do que nunca, as novas tecnologias estão permitindo que o que antes era ficção científica se torne realidade, como dispositivos móveis, comunicação instantânea em um mundo interconectado através de agentes inteligentes, e os primeiros passos que já estamos começando a dar na direção de conceitos como arquitetura líquida e ciborguização do ser humano. Mas a formação de uma cultura que leva o fetiche pelo objeto técnico para além dos círculos restritos dos nerds e geeks e o amplia até englobar praticamente toda a sociedade se deve em grande parte aos autores do Movimento Cyberpunk, e, dentre estes, mais do que nenhum outro, a William Gibson.